terça-feira, 15 de novembro de 2005

1996, Fevereiro, Berlim

Estou perto do S-Bahn Kleistpark, linha azul quase turquesa, se bem me lembro. O Inverno continua eterno. E os dias escuros. Tenho a Teresinha, dos seus dois anos e alguns meses, no carrinho. Empurro-a com meus braços. Passeamos o passeio do bairro, às voltas de Erdmmanstrasse. O comboio passa na linha, de cinco em cinco minutos. Atrás, o cemitério onde repousam as memórias aos irmãos Grimm. As árvores são as de todos os dias, igualmente despidas, sem cor, sem cheiro, regeladas. Poucas pessoas caminham na rua e só nós vagueamos.
Um rapazito em cima de uma bicicleta que é o seu cavalo vem ter connosco e pergunta-me com ar sério, num alemão com sotaque e perro: “Que horas são? Sabes onde fica o S-Bahn Kleistpark?”. Eu respondo. Logo de seguida queria saber se eu era alemã, se a Teresa era minha filha, se eu tinha homem, como, onde e quando tinha feito amor com ele pela primeira vez, se me tinha doído, se achava que ele me podia dar um beijo, se podia dormir comigo, e se ...se o sexo era só para gente grande e porquê.
Chamava-se Dennis, tinha 11 anos e era Jugoslavo. A enxurrada de perguntas que me fez..., não podia imaginar que fosse possível tanto desejo e ‘atrevimento’. Não sabia o que responder-lhe. Estava perplexa e percebia que ele já tinha espreitado alguma coisa para cada coisa que perguntava. “Sei lá, não te beijo porque,... porque me pediste um beijo e eu não gosto que me peçam beijos, porque eu não estou habituada a beijar meninos de 10 anos que querem experimentar fazer sexo com a primeira mulher que encontrem na rua.” Chegou mesmo a perguntar se eu queria fazer amor com ele, se queria ou não, e se não queria por ele ser muito novo e porque é que ele tinha que esperar se ‘já a tinha grande e dura’.
Queria saber a que horas chegava o meu homem e se fazia amor com ele todas as noites. Contou também a sua história, a da rapariga que conheceu e em quem pensou enquanto se baloiçava com a mão na casa de banho. Descreveu...” e depois veio um branco de repente.” Perguntou-me se era aquilo que fazia as crianças, se comigo tinha sido assim e se eu queria ter mais alguma. Falou-me do que os homens diziam e não diziam sobre isso de ter uma vontade vulcânica de tocar numa mulher. Eu disse-lhe que os homens diziam muitas coisas e que um dia ele iria descobrir se eram verdade ou não, mas ele não queria esperar uma eternidade de anos para dormir com uma mulher, e eu bem podia dormir com ele. Porque não? E eu não sabia explicar-lhe.
Aquela conversa interminável, sob a forma de interrogatório, começava a impacientar-me. De qualquer modo, tinha já por ele uma cumplicidade e ternura, ou qualquer coisa desse tipo.
Já perto de casa, mais exactamente nas escadas envelhecidas de madeira, e sem os lábios lhe tremerem, disse-me: “Só um beijo!”, e eu, sem saber muito bem porque sim ou porque não, acenei-lhe com um sorriso, enquanto a Teresinha, despreocupadamente, me agarrava na mão e acenava com a outra.
-“Dennis, kommt wieder?”
-“Sim, claro! Dennis kommt wieder!”

2 comentários:

Anónimo disse...

: )
Pura apneia do ser em registo sustenido.

Isabel Freire disse...

Or... your boy is getting older.