sábado, 21 de janeiro de 2006

O Homem do Táxi

Estava a fazer a porcaria de um trabalho, que metia violência. E nojo, de tão mal definido pelo cliente. Apanhei um carro de aluguer (soa tão bem, não soa?) a caminho de casa, ao final do dia. Sou agarrada aos táxis, adoro-os. Se pudesse atravessava o Oceano num daqueles com as mudanças coladas ao volante. Daqueles que têm aquelas manivelinhas que parecem boquilhas nos lábios delicados de mulheres de vestidos de cintura baixa e pena de pavão na cabeça. Já imaginaste? Primeira mulher do mundo pisa solo do Brasil após descoberta de um novo meio de locomoção marítima para as Américas de Cabrais e Coutinhos.
Naquele dia a viagem era curta, eu vinha carregada de aborrecimento. Enfadada. Tinha uma encomenda na pasta que me estava a virar a cabeça ao contrário. Escrever sobre violência. Eu perguntei-lhe: mas quer da Renova, da Clinex, Mini Preço,… que marca de papel é que trago? Com cheiro, duplo, negro, com relevos? Nada. Nem ideiazinha. E aquilo estava a cheirar-me ao xarope do costume, ao bem-u-ron para a febre [justiça lhe seja feita que me fez dormir muitas horas tranquilas]. A violência do costume. Que fartura. Entro no táxi, com a preocupação na cabeça. Sento-me (nunca me encosto nas viagens de táxi, não sei porquê), olho para o condutor, re-olho o condutor, tento novo ângulo no retrovisor. Faço uma pergunta inócua, banal, inofensiva, para sondar. Conduziria drunfado, drogado, embriagado? O semblante tinha um misto de sedução e terror. A resposta confirmou a segunda. Formação superior, um trabalho estável, uma viagem de lazer a França, e um carro com uma avaria. De capot aberto, repara que está estacionado quase à frente de uma 'filial' da Legião Estrangeira. Olha durante uns segundos. Olha de novo. Deixa de olhar e bate à porta, para saber como é que se pode inscrever como ‘sócio’. Se o destino o fez parar ali, o destino deve ter razões, terá pensado. Taca taca, maga maga, bum bum e já está. Aprovado. Toma lá uma camarata. Este homem marcou o meu ouvido para sempre. Isto tudo para falar de coincidências, não era? No táxi, só me disse 3 ou 4 frases: “Aconselho quem senta o rabo nessa cadeira a ter medo de mim. Já viajei muito por esse mundo fora. Estive na LE, percebe?”. Pedi-lhe o número de telemóvel e conversámos no dia seguinte, de mini disc sobre a mesa, e numa esplanada de pastelaria, sobre como se matam os homens.
… sex and violence!

4 comentários:

péssima disse...

: )
Ou talvez não (ainda hipoteticamente).

Isabel Freire disse...

este homem estava completamente 'fodido' físca, mental, emocional e sentimentalmente. vários anos ao serviço do mercenato, que terminou com um quase fim de vida num caminho poeirento do Chade, e um morteiro disparado ao focinho do carro militar que conduzia.
uns meses mais tarde, precisava q alguém levasse 4 jovens a um bairro onde os taxistas por norma não entram (Talaíde, em Oeiras) - mas claro, como para tudo na vida, há sempre excepções.

Isabel Freire disse...

WW: O meu emprego é não ter emprego e juro que me dá muitas noites mal dormidas. Nunca sei se vou ter dinheiro daqui a dois meses, quando me pagam o trabalho que foi publicado, quem compra o outro que penso fazer. Neste momento, só me apetece abrir um mini mercado e vender latas de sardinha. Sei que metade da minha ansiedade e inquietude passa por isto de viver na corda bamba, sem rede lá em baixo. Dava tudo, de momento, para mudar de vida. O legionário fez o mesmo, por motivos diferentes dos meu e dos teus, mas foi um mergulho de cabeça numa piscina sem água. O mais curioso é que sendo um homem altamente inteligente e consciente, voltaria a fazer tudo do mesmo modo. Não sei! Não sei! Acho que a coragem para mudar de vida chega ou não, e se chega é uma convicção com a força de uma espada. Eu fiz isso há um ano. E teria voltado a fazer o mesmo, mas muito muito mais cedo.
Bjs
...Vê se a piscina tem água antes do salto!

Isabel Freire disse...

Começa a procurar outro trabalho!!! Não desanimes. E sobretudo, não adormeças, WW. Podemos e devemos arranjar uma secção de oferta (caderno de emprego das mmás) aqui no Blog.
Bom... eu inscrevo-me tb. Se alguém conhecer uma merceariazita para trespasse na região de Lisboa,.. é favor deixar indicações.
:)