domingo, 19 de fevereiro de 2006

Ainda pesadelos

“Antes eu desenhava como Rafael, mas precisei de toda uma existência para desenhar como as crianças."
Picasso, pintor espanhol

Estive a consultar a net para tentar encontrar textos que apoiassem a minha teoria sobre os pesadelos das crianças.
Não encontrei.
Apesar de as idades serem coerentes com a minha experiência de mãe, 3-6 anos, as razões apontam sempre para stress ou problemas familiares ou sociais. Não sei, não conheço, nem tenho a experiência de educação enquanto teoria, mesmo assim recuso-me a aceitar como “óbvia” esta conotação tão negativa como causa dos pesadelos em idades tão tenras.

Para mim os pesadelos nessas idades têm muito mais a ver com a compreensão das vivências, o conhecimento dos "eu existo, mas há outros que também existem". Pode parecer a mesma coisa, mas para mim não é. Uma coisa é nós vivermos uma experiência traumatizante e sermos sobressaltados pela memória da mesma, outra é percebermos que a compreensão de um acontecimento pode causar determinadas consequências para as quais não estamos física ou mentalmente preparados para enfrentar.
A ver se consigo explicar isto de outra forma:
Se virmos um filme de terror/trauma/desgraça é provável que tenhamos uma noite mais agitada. Não por termos ‘vivido’ o mesmo que a personagem mas porque compreendemos que a acção é passível, e ao sonhar repetimos de forma readaptada uma possível, ou não, resolução da situação. No fundo estamos a aprender a viver com situações às quais não estamos habituados.

É assim que eu entendo os pesadelos infantis. Aprendizagens virtuais. Claro que existem as excepções, crianças maltratadas, com problemas familiares, e muitos outros problemas que nem me ocorrem, mas não são, quanto a mim, a maioria dos casos (felizmente).

Porque acontecem nesse período… Para mim é quando a criança começa a perceber que o mundo não é a família e a casa. Começam a entender que há outras crianças que são também a coisa mais importante do mundo para os pais deles.
Tento, sempre que me é mentalmente possível, colocar-me no papel da criança. Imagino-me com três anos, a brincar com um pedaço de qualquer coisa que antes fora brinquedo inteiro, chega uma outra criança e decide que também quer essa coisa, conflito: ‘dou ou não dou’? ‘sou mais forte ou tu é que és’? ‘simpatizo ou não’?. Se tiver um pesadelo à noite o que é que me atormenta? ‘Dei e não devia ter dado’, ‘Não dei mas devia ter dado’?, ‘a outra criança é mais forte que eu’?, ‘mordi-lhe e ela chorou’? ‘gosto da criança mas tirou-me o brinquedo, agora já não gosto’?
Ou se, por exemplo, chega uma mãe ou pai e faz uma festa barulhenta ao ver o filho, elevando-o no ar e mostrando (não de forma consciente) que essa criança é bem mais importante que os outros todos. Como reajo? Bato à minha mãe porque chegou depois? Abraço-me demasiado a ela para mostrar aos outros que também sou a mais importante? E se a mãe não corresponder às minhas necessidades imediatas, vou ter pesadelos? Acordarei ao meio da noite a berrar pela mãe, ou pelo pai?

Eu acho que os pesadelos infantis são até essenciais para um bom desenvolvimento. O importante mesmo é estarmos presentes e repetirmos vezes sem conta: Pronto, já passou, a mãe está aqui, shiuuu.
Dá trabalho? Dá. A maior parte das vezes nem damos conta de como chegámos à cama da criança? Sim. Por vezes dizemos coisas ainda mais disparatadas do que os próprios pesadelos das crianças, misturando os nossos próprios sonhos tipo: pronto, já fui ao frigorífico guardar os sapatos? Sim.
Mas só dá trabalho até à entrada para a escola primária, porque milagrosamente eles, pelo menos os meus, aprendem a lidar com os seus próprios pesadelos.
É na escola primária que culmina o entendimento de que fazem parte de uma sociedade maior do que a família. E que eles próprios fazem parte, em medida e peso igual, dessa sociedade.
Compreendendo isso aprendem a defender-se, a reagir bem ou mal, mesmo em sonho.

Mas claro, isto sou eu aqui a escrever sem grandes sabedorias.

Comecei este post com a intenção de linkar aqui os sites que achei mais relevantes, mas não se justifica, basta fazer uma procura no Google com “pesadelos infantis” e há uma dezena deles a dizer o contrário disto. E como entretanto encontrei ESTE, de onde me saltou a frase do início, perdi-me.
: )

5 comentários:

péssima disse...

VAI TU, para mim pelo espaço usado!

Desculpem lá qualquer coisinha
Deve ser o efeito das caipirinhas que bebi ao jantar
: )

Mimi disse...

mmmmmmm... caipirinha...

há limites de alguma espécie neste blog?
(todas em coro) NÃÃÃÃÃÃ00000000000 !!!!!!!!!

Isabel Freire disse...

Uma colher de mel de manhã, uma caipirinha à noite, e lentamente tudo muda. Estou em crer!
Ó PSSM vê lá se descobres alguma coisa sobre pesadelos aos 34 anos. Serão problemas socio-familiares ou apenas penas que se curam rapidamente?
Eu vou ganhar o prémio MMÁ Problemática 2006. Pelo menos tento!
PS: Juro que não vos contarei em pormenor a odisseia dos vizinhos idosos do lado, que estão ambos absolutamente loucos, nem o processo kafkiano que travo com a autoridade de saúde para que internem compulsivamente duas criaturas que nunca deviam estar a tomar conta uma da outra. Os pormenores são inacreditáveis, e as jornalistas de redacção que queiram questionar o papel do Delegado de Saúde Pública no nosso país têm aqui uma história cheia de pinta. Ninguém dorme aqui. A mulher empurra os móveis e parafernália decorativa diariamente pelas escadas, sempre entre as 3 e as 6 da madrugada e normalmente ao pontapé. A gritaria às vezes dura 18 horas por dia (parece que estão a matá-la). Quinta-feira fugiram os dois em pijama e chinelos, de malinha na mão, para a rua, pois tinham uma roulotte carnívora em casa. Na sexta partiram a fechadura da própria casa à martelada e fecharam a porta com um cordel. Hoje disseram-me que têm um plano de ir para os anjinhos e o Jesus vai entregar a chave ao senhorio. Como é que se pode dormir sem pesadelos assim? Como é que o Estado acha isto normal e põe em risco a vida de toda a gente aqui no prédio (ir para os anjinhos pode ser a cavalo no gás...). A Santa Casa da Misericódia teve cá, disse que sim, que estavam ambos loucos, mas que talvez se resolvesse o problema com apoio domiciliário, pois - afirmava a especialista em acção social - não lhe parecia um caso violento. Fuck. Devia ter levdo com o martelo com que a senhora partiu durante 4 horas uma fechadura daquelas com canhão de 4 bombas. Onde está a Europa neste país? E isto é só um começo da história.

péssima disse...

Macs salvam redação de jornal em dia de colapso nos PCs/Windows

ehehehehehe
Não sou tendenciosa não senhora!

http://www2.uol.com.br/macpress
/noticias/c043s04547.shtml

péssima disse...

Ó não, não! Os pesadelos, aos 34, são apenas os ventos da mudança que passam pela fresta da janela, colidem com a tua mente e preparam-te para o que tu já sabes, mas não sabes, não porque não sabes mas porque não queres saber, porque se quisesses não resolverias de todo as mudanças que sabes que tens de saber fazer!
Pronto, simples.