As ‘mmás’ são um espaço e um tempo para experimentação não isolada. Uma forma de sair do armário da maternidade, com liberdade para que mães, mulheres anónimas, se exponham, se interiorizem, se lembrem, se banalizem, se encontrem, se distanciem, se analisem, se ilibem ou o que bem entenderem.
domingo, 5 de fevereiro de 2006
Procura-se!
Já lá vão uns oito anos. Estou em casa, é noite e o telefone toca. Uma voz feminina, madura, carinhosa, expectante, para não dizer ofegante, pergunta pelo meu nome. “Sim, sou eu”. Depois desta frase só voltei a dizer uma palavra 3 ou 4 minutos depois. Os factos são simples. A mulher tinha entrado naquela mesma manhã na Igreja de Santo António, em Lisboa (construída graças à perseverança dos meninos que pediram esmolinhas pelas ruas, depois do terramoto de 1755, e às doações dos fãs do Santo. A tradição pegou de tal maneira que ainda hoje as crianças chateiam na altura das festas da cidade, com a esmolinha para o Santo, apesar de o Santo já ter casa). Hum… cá estou eu a conduzir aos ‘ésses’, mas o último copo foi hoje às 5 da madrugada. A mulher, raios! Sim, a mulher! A mulher falava e eu ouvia muito aparvalhada. “Fui comprar uma novena à Igreja. Sabe, Santo António é o meu protector, queria rezar-lhe uma novena, e fui lá comprar o livrinho. Sabe qual é a igreja não sabe?”. Eu estava prestes a mandar um grito: “Porra, quer dizer o assunto de uma vez por todas?”. Exactamente tão irritante quanto esta verborreia inconclusiva – imagino que o vosso instinto seja agora de me apedrejar! – graças a ‘deus’ tudo isto é virtual.
“Aquela igreja mesmo ao pé da Catedral. É que eu sou enfermeira, e vivo ali em Alfama. Mas sabe que quando abri a novena, já fora da igreja, e olhe que o livro estava novo, até nem tirei o primeiro da pilha, escolhi o que tinha melhor aspecto. Quando o abri já cá fora, encontrei um papelinho escrito à máquina com o seu nome e número de telefone. Bem sei que isto parece estranho, até é capaz de pensar que é mentira, mas olhe que eu sou uma pessoa séria, uma mulher de fé, e estou a ligar-lhe para ver, quer dizer, para falar consigo. Não sei, o Santo,… sabe,… bem,… é extraordinário, eu tenho pouco tempo e os meus horários são um bocado malucos, mas queria saber se a senhora tem tempo para nos encontrarmos um dia destes, isto deve querer dizer qualquer coisa, não acha?”.
Fiquei com o telefone dela. Disse-lhe que sim, evidentemente poderíamos encontrar-nos. Baixei o auscultador, e fiquei uns segundos de boca aberta. Nunca cheguei a fazê-lo (a ligar-lhe, entenda-se, fechar a boca fechei logo depois). Lembrei-me dela ontem, novamente, quando uma amiga me contava que estava à procura de um homem, de um romance, de um companheiro, e que “há 5 meses não dava uma ‘queca’”. Segundo a sua análise, tudo tinha a ver com o universo em que se mexia, as pessoas com quem se relacionava, e o auto-diagnóstico apontava para uma necessidade urgente de mudar de ares, no fundo. A mim saiu-me dizer-lhe que a minha vida estava marcada por profundas inversões de marcha à conta de esbarradelas em sinais de trânsito. Hoje fui à procura do contacto da mulher de Alfama, nas agendas dos últimos 8 anos, para ver se resolvíamos o mistério do Santo. Não encontrei nada. Levarei mais tempo, mas sei que lá chego. Se alguém a conhecer, agradeço o link.
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5 comentários:
Bem,...caras mmás, como vocês andam muito caladinhas, eu não tenho feito qualquer exercício de sintomia, adequação, what ever e vou escrevendo o que me dá na moca. A raposa está de férias desde ontem na casa da avó e eu hoje fui à praia ver o mar: Precisava 'espirrar' fundo.
Sabes…
Acho que todos os dias ignoramos as “verborreias inconclusivas”.
Depois acabamos por não perceber o que é que realmente quer dizer alguma coisa, ou então desesperamos à procura dos significados subliminares.
Um dia gostaria de reagir de imediato a esses quereres de algo, de forma simples, sem razões justificáveis, e sentar-me a ver no que dá.
Como que a saborear aquela sensação de tudo em aberto.
É curioso que eu própria também não sei o que quero dizer... e depois olho com mais atenção e percebo que faz muito mais sentido do que me parecia à partida. Provavelmente só para mim, que ando numa fase non sense aguda.
:) :) :)
curiosa como sou, teria ido ao encontro da senhora. essa história é realmente estranha, logo muito apetecível...
Eu deslindei o enigma, logo depois, mas acabei por nunca telefonar à senhora. Há sempre tanto sobrenatural no dia a dia que nem sempre o tempo chega para tudo. Um dia conto-vos como quase me casei, sem consciência, com um paquistanês.
:)
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