terça-feira, 28 de fevereiro de 2006

Ovo de Colombo

"Quando vou às casas de banho do Colombo, os fraldários estão nas casas de banho das mulheres. Isto é altamente formatador."
"Uma mãe solteira é vista como o resultado de um azar na vida ou de uma pouca-vergonha. Um pai solteiro é uma pessoa muito corajosa. Acho que sofro uma discriminação positiva, mas que advém de um preconceito terrível."

Duas coisas óbvias, que só ganham força por terem sido ditas por um pai solteiro a uma reportagem de Sarah Adamapoulos publicada da NS' desta semana. Um pai solteiro é aquele que adopta uma criança sozinho. A NS' é a revista que sucedeu à Grande Reportagem.
No editorial, Francisco Camacho defende que "convém pôr cobro a algumas futilidades medievais que subsistem neste problema [da adpoção], como a importância dada à orientação sexual dos candidatos a pais adoptivos".
Cresci numa casa grande, onde cabiam todos os amigos da minha mãe. Muitos chegaram a morar lá. Todos levavam namorados e namoradas, maridos e mulheres. Alguns eram homossexuais, outros bi e outros hetero. Para mim tudo aquilo era normal. Houve um dia que a minha mãe teve que me explicar que não podia dizer em público "o quarto da J e da L", porque havia preconceitos contra os homossexuais. Teve que me explicar o que era um pré-conceito e o que era um homo-sexual. Homo, hetero. Mesmo, diferente. Percebi os conceitos linguísticos, mas nunca percebi o preconceito.
Para mim, felizmente, o preconceito apareceu depois. O preconceito dos outros, leia-se. O que eu sempre vi foi casais e pouco me ralava de que sexo eram. Até hoje continuo sem perceber a homofobia, se bem que a palavra fobia diz muito. A J e a L ainda moram juntas - são mulher e mulher, desde os tempos da faculdade. Não têm filhos.

8 comentários:

Isabel Freire disse...

4 notas:
-corro sérios riscos de me tornar mmá solteira.
-futilidades medievais é uma expressão muito bem tirada.
-não vejo por que motivo homossexuais não possam adoptar crianças, aliás conheço dois casais que o fizeram, e por outro lado acho inadmissível que alguém espere meses ou anos por uma família mono ou pluriparental.
-os quartos escuros estão cheios de homofóbicos.

Mimi disse...

então mas anda tudo em crise, menos eu? eu e a minha mania de ser diferente! por enquanto só ando a reflectir sobre assuntos sérios. batatas! assadinhas a murro, de preferência. nhiam!

Eu sou LEGALMENTE mãe solteira. E tu também. Acho que é isso que quer dizer o SOLT. (ou será SOL.? mmmmmmm... sugestivo. Os divorciados serão luas? e os viúvos? e os casados? serão Marte?)

e se começassem a pôr os unidos de facto nos BIs? Seríamos UF? Tanto dá para UF, que que alívio! como para UFO, de OVNI. Adiante, que já me perdi...

O editorial do Camacho seguia depois nesse sentido - "é também urgente acabar com entraves absurdos, como a burocracia infernal e o tempo que demora um processo de adopção. Porque a verdade é esta: há catorze mil crianças em Portugal à espera de uma família; algumas, como todos nós suspeitamos, sabe-se lá em que condições."

UF! Catroze mil crianças são muitas crianças. E depois raptam-nas dos hospitais... Não havia eu de ter medo quando estive na MAC! Qual xixi qual quê, fico é aqui ao pé do meu precioso bebé!

Quanto à ligação entre a homofobia e a homossexualidade encapotada, há triliões de estudos sobre isso e a percentagem é qualquer coisa tipo (estou a falar de cor) 80% dos homofóbicos são homo ou bissexuais... Patético, portanto.

Caiê disse...

Por acaso, informei-me sobre a adopção e o que me disseram estarreceu-me. Se és solteiro, tens de ter mais de 30 anos; se és casado, tens de ser casado há mais de 5 anos, para provar a estabilidade do casal (pausa para nos rirmos... como se o tempo provasse a estabilidade! quando tem de quebrar, a corda quebra!).
Depois de provares a tua estabilidade emocional e económica, metem-te numa lista de espera. Se não tiveres exigências (tipo: quereres um bebé em vez de um puto crescido), a coisa pode demorar só dois anitos.
Ah, e convém que tanto tu como o teu marido/ companheiro (porque informei-me foi em Portugal, onde não está legalizada a adopção feita por duas pessoas do mesmo sexo) sejam portugas, porque se forem estrangeiros a coisa complica-se... Triste.

Anónimo disse...

O meu tio avó andava com o filho da tia dele, e todos sabíamos. A minha avó não era de facto minha avó mas sim irmã da primeira mulher do meu avô que trocou o lar, filhos e marido por um brasileiro mais sedutor. O meu padrasto e a minha mãe casaram duas vezes um com o outro. A minha descendência é fruto de vários solteiros diferentes. Não sei estrelar um ovo, faço reciclagem, castro as minhas gatas, voto PS, tenho um genro com boas notas na faculdade, vários blogs, sou mulher e gosto de andar por aqui. Devo ser normal portanto.

Isabel Freire disse...

:)
e ainda não sabes o que assinar - o que acho muito bom sinal!

Mimi disse...

e nós gostamos de te ter por cá, sem que te confundamos com natais agressivos. ando farta de gente agressiva

Mimi disse...

caríssima b. bem-vinda!
Lembras-te de quando ia para o balcão do Deslize sozinha beber um copo e ver se aparecia alguém logo depois do noticiário da meia-noite?
Na altura era uma chavalita e ninguém comentava por aí além.

Hoje, se saio do trabalho à uma da manhã e me apetece beber qualquer coisa num outro balcão ondo gosto de estar, já sinto os olhares "levou uma tampa - coitada", isto quando não me aparece um garanhão qualquer a dizer "não pude deixar de reparar que estás sozinha, posso fazer-te companhia". E não estou assim tão fora de prazo para que não me PERDOEM a solidão voluntária...

Ainda há dias, quando fomos à Frida Kahlo, a Péssima e eu comentávamos isso. Ela conquistou o direito à 6ª feira e teve que se habituar a voltar a estar sozinha e a ignorar os olhares dos outros.

E ainda há dias passei por aquele episódio brilhante no parque infantil, em que aquela mãe me gritou "sua mulher divorciada" por não estar acompanhada de macho, nem anilhada.

Um homem sozinho num bar não incomoda ninguém: está a beber um copo, ou está à caça. Já uma mulher...

Coisas para observar sob uma perspectiva antropológica.

Mimi disse...

ou antropo-sociológica.